sábado, 30 de junho de 2012

O MUNDO FUTURO

Merval Pereira, O Globo


O empresário Roberto Teixeira da Costa escreveu para o próximo número da revista “Política Externa” um artigo em que relata recente debate ocorrido no Instituto Fernando Henrique Cardoso intitulado Global Trends 2030 (Tendências Globais 2030), liderado por representantes do Espas — European Strategic and Policy Analysis; da ISS — European Union Institute for Securities Studies; do The Office of the Director of National Intelligence dos Estados Unidos; e do Atlantic Council, com a participação da FGV do Rio de Janeiro, representada pelo economista Marcelo Neri.


Na ocasião foi distribuído um livro cujo título, “Citizens in a interconnected and polycentric world” (“Cidadãos num mundo interconectado e policêntrico”), define bem a visão de futuro do grupo: um mundo cada vez mais interconectado, com vários centros de decisão.


A seguir, algumas conclusões e observações dos participantes anotadas pelo empresário.


O empoderamento dos indivíduos contribuirá para que adquiram o crescente sentimento de pertencer a uma única comunidade humana.


O mundo policêntrico será caracterizado pela mudança de poder dos Estados e por crescentes deficiências dos governos, sem responder de maneira adequada às demandas públicas globais.


A convergência de preocupações e a crescente vocalização de demandas serão enorme fator de contrastes com a capacidade dos governos de atender a elas, particularmente aquelas referentes à melhoria da qualidade da vida.
Esse gap será uma fonte permanente de tensão e conflitos sociais, podendo ser agravado pela ineficácia dos governantes.


De acordo com as Nações Unidas, em 2030 a população mundial atingirá 8,3 bilhões de pessoas. Grande parte desses indivíduos ganhará mais poder pelos progressos sociais e tecnológicos.


Nas últimas décadas o grande motor desse empoderamento foi a emergência de uma classe média, particularmente na Ásia, com acesso à educação aproximando-se de padrões mundiais pelos efeitos da informação e da comunicação tecnológica, e também com a evolução do “status” das mulheres na maioria dos países.


Em 1990, cerca de 73% da população mundial sabiam ler e escrever. Em 2010 atingiu 84% e estima-se que, em 2030, chegue a 90%.


A classe média aumentará sua influência, passando de 3,2 bilhões, em 2020, para 4,9 bilhões em 2030. Estima-se que esses cidadãos serão mais influentes que os antecessores de gerações passadas.


De qualquer forma, apesar dessas progressões, quando um número crescente de pessoas for beneficiado pela “era da informação”, diminuindo o chamado “digital divide” (a projeção é que, em 2030, metade da população terá acesso à internet), muitos indivíduos, quer por falta de eletricidade, analfabetismo ou ausência de acesso a telefones celulares, continuarão marginalizados.


O aumento da classe média não resolverá persistentes pobreza e desigualdade. Uma classe média burguesa emergirá na América Latina e na Ásia.


De qualquer forma, segundo relatório recente do Banco Mundial (2011), entre 2005 e 2008 — desde a África subsaariana até a América Latina, e desde a Ásia até a Europa Oriental —, a proporção de pessoas que vivem na pobreza extrema (em renda inferior a US$ 1,25 por dia) vem diminuindo.


O fortalecimento dos indivíduos também terá consequência, particularmente na sociedade civil, tendo grande impacto em como as políticas públicas serão conduzidas.


Usuários da internet poderão ser motivados a um maior engajamento em assuntos de natureza política. O temor é o de que todas as demandas sociais, justas ou não, façam enorme pressão sobre as instituições e partidos democráticos, podendo abrir espaço para um populismo radical, cuja saída poderá caminhar para a tentação do autoritarismo.


Apesar do progresso, sistemas educacionais fracos e o prevalecimento de doenças (epidêmicas ou não) continuarão sendo pesada carga para o desenvolvimento humano.


A corrupção será um fator de restrição ao desenvolvimento sustentável, funcionando como um dos principais obstáculos à inclusão social e à operacionalidade da economia de mercado.


As mudanças climáticas trarão sérias consequências e afetarão os padrões de vida e de segurança pública pela exacerbação da falta de água e de alimentos.


A degradação ambiental provocará desastres humanitários, inclusive com a desertificação e enchentes de grande escala em algumas regiões.


Maior estresse no desenvolvimento sustentável, tendo como pano de fundo maior escassez de recursos e persistente pobreza, potencializada por mudanças climáticas.


A água será um fator desestabilizador entre países fronteiriços, como, por exemplo, China e Índia. Tensões pela disputa entre países por matérias-primas poderão vir a acontecer.


A competição por recursos vai exacerbar tensões e provocará conflitos. Crise de energia sensibilizará e demonstrará que estaremos penetrando em uma “era de escassez”.


O modelo de economia de mercado prevalecente no desenvolvimento continuará sendo questionado. Os governos financiarão mais projetos de pesquisa para energias limpas e renováveis, que poderão ser insuficientes ou que os obrigarão, desde já, a tomar sérias iniciativas para melhorar e buscar maior eficiência energética.


Na questão de segurança humana e proteção dos cidadãos, muito embora seja um tema sempre presente, não se imaginam guerras entre os superpoderes, como também, está descartada uma maior conflagração envolvendo armamentos químicos, biológicos ou nucleares nas próximas duas décadas.


Conflitos motivados por nacionalismo e políticas de identidade extremista poderão acontecer, assim como (associados ou não) massacres genocidas. Serão a preocupação principal da governança mundial.


Organizações criminosas e movimentos populistas nacionalistas poderão tornar os Estados mais vulneráveis, como, aliás, tem acontecido em alguns países na América Latina.


O terrorismo continuará sendo grande preocupação, assim como os conflitos urbanos de baixa intensidade, que não deixarão de ser considerados nas políticas de segurança interna. (Amanhã, o Brasil e o mundo).

sexta-feira, 29 de junho de 2012

UMA JÓIA ENCRAVADA NO SERTÃO PARAIBANO

Se essa jóia cravada no Sertão paraibano, em Brejo do Cruz, cercanias de Catolé do Rocha, estivesse localizada na França, por exemplo, estaria completamente restaurada e preservada para a posteridade. Como não está, corre o risco de desaparecer. Ah!, esse meu Sertão misterioso e cheio de histórias. E de estórias também. Que o diga Ariano Suassuna... Fotografia e texto conseguido através da gentileza de Cezário Maia.



quarta-feira, 27 de junho de 2012

MINHA AMADA GOSTA DAS CIDADES GRANDES...

Honorio de Medeiros
    
Para Bárbara Lima 


Minha amada gosta das cidades grandes, do bulício das ruas elegantes nas manhãs de sol pálido que não lhe agrida a pele muito branca, quando se dedica às compras “virtuais” e compõe mentalmente, enquanto deambula, várias toilettes com as peças à mostra, da rotina dos cafés ao entardecer que são promessas de noite e despedidas do dia, das noites suavemente embaladas por uma discreta taça de vinho, à qual seguem, como um coroamento de um dia feliz, un dessert, e um sono tranqüilo, embalado pela confortante presença próxima do seu ateliê, onde se dedica à requintada arte do “scrap”, no qual obras de arte feitas à mão disputam espaço com as marcas sutis de sua presença diária.

                        Já lhe ponderei, diversas vezes, acerca das maravilhosas manhãs na Serra, quando a neblina propõe, aos transeuntes, um véu opaco com o qual os envolve enquanto o silêncio, companheiro de nossas caminhadas, somente é perturbado pelo ir-e-vir dos pássaros e o balançar dos ramos e galhos das árvores tangidas pelo vento matinal, e, também, das tardes pungentes tão típicas e plenas de uma profusão de cores cambiantes que esmaecem lentamente anunciando a noite, ah!, a noite, e o imenso céu estrelado, límpido, misterioso, inigualável, do Sertão...

                        Eu lhe prometi um espaço somente seu, amplo, no qual cada laivo de sua imaginação criadora tenha a condição de se transformar em realidade, separado do chalé com o qual sonho por um caminho margeado pelas flores das quais tanto gosta e pelas árvores das quais sou tão próximo, onde ela poderia receber as pessoas que a procurassem lhes oferecendo um café feito na hora a ser servido nas delicadas e herdadas xícaras onde despontam motivos florais finamente estampados, acompanhado de biscoitos da terra, de gosto suave, que facilmente se dissolvem na boca, ou, quem sabe, nos frios dias de julho, uma taça de chocolate quente enquanto a conversa fluísse animada.

                        Receio não lhe ter convencido, posto que o prosaico da vida sempre interfere nos sonhos de cada um: é a rotina do trabalho, a rotina dos filhos, a rotina dos compromissos que exigem nossa presença diária e nos impõem atividades que não gostamos, deveres que nos assoberbam, atenções que nos impedem de nos entregarmos plenamente à vida que passa tão rápida enquanto desperdiçamos nosso tempo a ranger os dentes de raiva pelo trânsito que não flui, a nos eriçarmos para o combate com nossos estressados semelhantes, a nos debater com a melancolia que nos assoma no final-do-dia pelo muito que é perdido quando constatamos que nada mais somos que apenas outra peça da engrenagem.

                        Quantos de nós, envelhecidos, eu não observo enquanto me desloco: são tão poucos os que sorriem! Será que neles há o fastio do acúmulo das horas inúteis, a consciência do tempo perdido com coisas vãs? Será que esse balanço de final-de-vida, quase sempre negativo, é que lhes colocou nos rostos esse olhar vazio, tão distante? Será que essa entrega derradeira, o abandono da condição de controle do próprio destino, é que constitui o caldo de suas amarguras?

                        Como saber? Enquanto penso dou razão à minha amada e me conformo, mas não perco a esperança. Enquanto espero, e os dias rolam na minha vida como as contas de um terço rolam nas mãos daqueles que rezam, escapo para o último andar do prédio onde moro, prédio entre prédios, subo a escada que conduz ao topo, e lá, derramo meu olhar descontente por sobre a cidade febril enquanto gulosamente sinto, sobre mim, o infinito do céu no qual os limites existente são o vôo dos pássaros e de um ou outro avião.                      

O GOVERNO DOS ILUMINADOS

Do Blog de Ricardo Noblat

Cresce em toda parte a autoridade da Suprema Corte, por Joaquim Falcão


O que tem a ver com o Brasil a renúncia do ministro do Supremo na Espanha?

Aliás, mais do que ministro, a renúncia foi do presidente do Supremo e do CNJ de lá, que se chama Conselho Geral do Poder Judiciário (CGPJ). O que tem a ver com o Brasil? Aparentemente nada. Na verdade, tudo.

O presidente tentou permanecer no cargo. Conseguiu até uma decisão de seus colegas do Supremo a seu favor. Mas só de protestos na internet foram mais de cem mil. Não foi preciso decisão em processo legal. A pressão ética e política foi maior.

O Presidente Carlos Dívar teve que renunciar porque usou dinheiro público para fazer viagens de fim de semana não oficiais. Pouco dinheiro. Não importa a quantia. Importa o gesto, suas consequências e a evidência da acelerada mudança do fundamento político da autoridade do Supremo. Na Espanha, no Brasil e no mundo.

Nestes mesmos dias uma decisão do Supremo na Venezuela não reconheceu a legitimidade de dois líderes de partidos que se opunham ao governo, o que prejudica a possibilidade de vitória da oposição contra Chaves.

No Egito, o Supremo considerou a eleição para o Parlamento inconstitucional e ordenou sua dissolução, o que altera os rumos da vida política de um país com Supremo, mas sem constituição.

No Paquistão, o Supremo também decidiu pela inabilitação do Primeiro Ministro, cuja consequência deve ser a necessidade de nova escolha e novas eleições para preencher o cargo no Parlamento. Tudo em menos de três semanas.

Sem falar nos países da Europa. As políticas econômicas recessivas e o incontido apoio dos governos aos bancos vão, como foram nossos planos econômicos, ser contestadas nos seus respectivos Supremos. Provavelmente.

Parece ter razão o ministro Lewandowski quando lembra que o século XX pode ter sido o século dos executivos fortes. Mas o século XXI será o século dos Supremos fortes. Detentores da última palavra. Para o bem ou para o mal.

De onde está vindo a crescente autoridade de Supremos mais poderosos? Mais do que de uma necessidade política estabilizadora, esta autoridade precisa da autoridade moral de seus ministros, de sua aceitação pela sociedade, de decisões não partidárias ou corporativas.

Cresce sobretudo a necessidade de ilibada reputação da vida pessoal dos magistrados.

Não podem pairar dúvidas de comportamentos não explicados. Ou quando explicados, não convincentes. O intenso e mobilizado mundo da participação política na internet protesta. Retira legitimidade e autoridade de ministros e instituições.

De certa maneira estamos voltando à aldeia antiga. Onde a autoridade comunitária residia nos velhos sábios de reputação ilibada. De vida vivida e comprovada. Sem ambições futuras que não o bem de sua própria aldeia.

Estes fatores – reputação pessoal, isenção política, desambição corporativa e de enriquecimento - estão voltando à moda. O mundo está exausto da apropriação pessoal e política das instituições democráticas.

Esses fatores deverão pesar nas futuras escolhas da Presidente Dilma para nosso Supremo.